É engraçado dizermos que o lugar mais legal que visitamos na nossa viagem pela Itália não faz exatamente parte do território italiano. Localizada na região leste da Emilia-Romagna, cerca de 10 km do Mar Adriático e no alto do Monte Titano, exatos 657 metros acima do nível do mar, a Serenissima Repubblica di San Marino (ou apenas San Marino) é o terceiro menor país da Europa (após o Vaticano e Mônaco) e reivindica ser a república mais antiga do mundo, com o mesmo sistema político desde o século 12. Tem a constituição mais antiga do mundo ainda em exercício, promulgada no ano de 1600, e tem uma das maiores rendas per capita da Europa.
De acordo com a tradição, San Marino foi fundada no ano 301 d.C. por Saint Marinus, um pedreiro nascido na ilha de Rab, Dalmácia (parte da Croácia) e que escalou o Monte Titano para fugir da perseguição contra os cristãos comandada pelo imperador romano Diocleciano, e lá estabeleceu um pequeno povoado cristão.
Visão do vale que circula a Città di San Marino
Em 1291, o Papa Nicolau IV reconheceu a independência de San Marino, reafirmada em 1631 pelo Papa Urbano VIII. Mesmo após Napoleão invadir a península Itálica, em 1797, San Marino rejeitou servir a expansão dos estados papais e com muita diplomacia manteve sua independência. Ao fim das guerras napoleônicas, o Congresso de Viena de 1815 ratificou a independência de San Marino.
San Marino teve um papel importante na independência italiana, quando em 1849 ofereceu refúgio a Giuseppe Garibaldi após tentar expulsar os austríacos, que como retribuição manteve sua soberania sanmarinese após a unificação italiana. Na Primeira Guerra Mundial o país lutou ao lado dos italianos, já na Segunda Guerra se manteve neutro e abrigou cerca de 100 mil refugiados. No entanto, em 1944 foi bombardeado por um avião dos aliados ao combater os alemães em território italiano.
As ruas peatonais da Città são um festival de curvas, ...
... repletas de sobes e desces, monumentos bem conservados e flores, ...
... e que exigem um belo preparo físico!
Como qualquer país, San Marino tem sua própria bandeira, ministérios, corpo consular e forças armadas, até seleção de futebol (embora seja considerada pela FIFA a pior seleção do mundo, que recentemente conquistou um empate após inacreditáveis 67 derrotas seguidas). Apesar de não fazer parte da União Europeia, San Marino utiliza o euro como moeda corrente.
San Marino não tem aeroporto, portanto para chegar é preciso entrar pela Itália, país com o qual divide o mesmo sistema político e idioma (embora chamá-los de “italianos” pode soar um pouco ofensivo – não que eles não gostam dos italianos, são apenas extremamente orgulhosos de sua independência). Para os(as) colecionadores(as) de vistos no passaporte, é só comparecer no Ufficio del Turismo (Contrada Omagnano, 20) e desembolsar €5 por um selinho simpático e um carimbo de entrada no país.
Visão da Rocca Cesta e Via delle Streghe a partir da Rocca Guaita
Visão da Rocca Guaita e Via delle Streghe a partir da Rocca Cesta
Como chegar: O aeroporto mais próximo é o da cidade de Rimini, distante 27 km de San Marino. De trem também não é possível chegar, pois San Marino não possui estação ferroviária. A estação mais próxima também fica em Rimini, de onde sai o ônibus 72 a cada 1 hora e 15 minutos, que sobe até a capital, a Città di San Marino (€6). Por causa das subidas e estradas sinuosas, a viagem dura cerca de 50 minutos. Também é possível chegar de carro, as estradas são tranquilas e bem sinalizadas – entrar em San Marino é o mesmo que entrar em uma cidade italiana qualquer, pois não há controle na fronteira.
Quanto tempo ficar: As principais atrações estão concentradas na Città di San Marino, capital do país e Patrimônio Mundial da UNESCO desde 2008, cercada por uma muralha de 500 anos repleta de história e de monumentos bem conservados. O ideal é ficar na cidade pelo menos 2 dias, tempo suficiente para conhecer as principais atrações e descobrir as belezas escondidas de uma cidade medieval. Quase toda peatonal, somente em algumas ruas é permitido o tráfego de carros (e somente se eles forem pequenos).
Teleférico que conecta a Città com Borgo Maggiore
O mapa da cidade com a indicação das principais atrações pode ser consultado aqui.
Existem três “portas” que permitem o acesso à cidade muralhada: (1) a Porta di San Francesco (ou “Portal del Loco”), localizada na parte baixa da cidade muralhada e principal entrada para os que chegam de ônibus; (2) para os que estão de carro, é possível subir as vias íngremes e sinuosas até a Porta della Fratta, distante apenas 10 minutos de caminhada da Rocca Guaita (em tempo: ao lado da porta há um bolsão de estacionamento pago). Para os que preferem não encarar as intermináveis curvas da subida, é possível deixar o carro em Borgo Maggiore e subir de teleférico, um passeio de 5 minutos até a estação Stazione Funivia, na parte oeste da Città.
Porta di San Francesco
A Chiesa di San Francesco (1361) fica ao lado da Porta di San Francisco e é a mais antiga igreja do país. Após várias restaurações, seu interior foi convertido em estilo neoclássico, e apenas as paredes externas mantêm as características originais. Localizado no antigo claustro do convento franciscano, o Museo San Francesco reúne uma importante galeria de arte e museu de arte sacra com obras dos séculos 14-18.
Chiesa di San Francesco
Nossa primeira parada é na Piazza della Libertà, principal praça da cidade e onde está localizado o Palazzo Pubblico (1894), construído em estilo neogótico e atual sede dos poderes governamentais de San Marino. A fachada é coroada pela torre do relógio é caracterizado por grandes arcos. No topo da torre pode-se notar pinturas de santos católicos. No centro da praça está a Statua della Libertà (1876), representada como um guerreiro que avança ferozmente com uma mão estendida para a frente e com uma bandeira. A cabeça é uma coroa com três torres, representando a cidade murada de San Marino.
Palazzo Pubblico
As torres de San Marino são os cartão postal do país. Construídas voltadas para a parte baixa do país, na costa mais alta do Monte Titano, durante muitos anos elas serviram para vigiar e proteger a cidade dos ataques do Malatesta de Rimini. Atualmente são muito procuradas não apenas pelos amantes de história, mas também por seus mirantes, que em dias com bom tempo permitem enxergar até o Mar Adriático.
A mais antiga das três torres é a Rocca Guaita, erguida no século 11. Fez parte do Castelo de Guaita, que antigamente chegou a ser usado como prisão. É a única torre que tem uma capela, a Cappella di Santa Barbara. Visitá-la custa €3. Mas o grande destaque, sem dúvida, fica por conta da vista. Lá do alto é possível ver praticamente San Marino inteiro e também proporciona ótimas fotos da segunda torre que visitamos.
Rocca Guaita
A Rocca Cesta (século 13) é a segunda torre de proteção, localizada no ponto mais alto do Monte Titano (756 metros de altura), erguida aproveitando as ruínas de uma antiga fortaleza italiana. Também é possível visitá-la (€4,50). Pra quem gosta de armas antigas, essa torre é sede do Museo delle Armi Antiche Di San Marino, com cerca de 2000 exemplares entre armas, armaduras, espadas e punhais dos séculos 16-18.
O trajeto entre estas duas torres é feito pela Via delle Streghe (Via das Bruxas), uma sequência de degraus construídos sobre as muralhas da cidade, que invariavelmente lembram uma mini-muralha da China, seguido pela Salita alla Cesta, uma rampa que exige, além de um bom preparo físico, um bom tênis com solado anti-derrapante, pois as pedras são bem escorregadias.
Salita alla Cesta
Queria muito saber como esta árvore foi parar aí!
A terceira e última torre é a Rocca Montale (século 14), que fica bem afastada da Rocca Cesta (cerca de 20 minutos de caminhada). Para chegar, siga pela Salita al Montale, uma estradinha pavimentada que passa no meio de uma floresta e que intercala rampas e escadas. Diz a lenda que a torre tinha um sino, usado pra alertar a população de possíveis ataques dos inimigos. Também foi usada como prisão, localizada seis metros de profundidade. Pode ser vista por fora, porém é a única das três torres que não pode ser visitada por dentro.
Salita al Montale
Nosso próximo destino foi a Basilica di San Marino (1838), principal igreja do país, localizada na Piazza Domus Plebis e erguida em estilo neoclássico no mesmo local de uma antiga igreja românica do século 7 (e que sucedeu outra, do século 4). A fachada frontal tem seis colunas coríntias, já o o interior é dividido em três naves com 16 colunas coríntias e sete altares que formam uma grande ambulatorial em torno da abside semicircular. O altar é adornado por uma estátua de São Marino feita por Adam Tadolini, cercada por relíquias do santo encontradas em 1586. A torre do relógio foi reconstruída no século 17.
Ao lado da basílica está a Chiesetta di San Pietro (século 16), acessada através de uma escada na torre do sino. Na cripta há dois nichos que, tradicionalmente, eram as camas de San Marino e San Leo. Em 1849, a igreja abrigou Giuseppe Garibaldi após a queda da República Romana.
Basílica di San Marino (esq) e Chiesetta di San Francesco (dir)
O imponente Teatro Titano (1777) é usado para espetáculos de música clássica, composto por três níveis de assentos, com poltronas do térreo e dois balcões superiores em formato de “U”. No centro da primeira linha está o “Palco della Reggenza”, área exclusiva para acomodar os Chefes de Estado e Governo. O palco está decorado com figuras em relevo que contam a história da República desde as suas origens, já a cúpula tem brasões dos castelos de San Marino.
Além das imperdíveis atrações históricas, San Marino reúne alguns museus um tanto curiosos, como o “Museo delle Cere” (mais de 100 personagens; Via Lapicidi Marini, 17; €7), “Museo della Tortura” (mais de 100 dispositivos dos séculos 16 e 17; Lato Porta San Francesco; €8), “Museo delle Curiosità” (Salita alla Rocca, 26; €7,50), “Museo delle Armi Moderne” (mais de 2 mil armas de fogo das duas Guerras Mundiais; Contrada della Pieve, 2; €3), “Maranello Rosso Collezione” (são dois museus, o primeiro reúne 25 modelos Ferrari e o segundo abriga 40 modelos Abarth; €12 cada museu) e “Museo dei Vampiri e Licantropi” (para os fãs de vampiros e lobisomens; Contrada Dei Magazzeni; €8).
Mesmo sendo um museu medieval a céu aberto, para muitos a principal atração de San Marino são as compras, já que o lugar é famoso por ser “tax free” para estrangeiros, uma forma de “estimular o turismo” (como se precisasse). O desconto de 17% do IVA é dado diretamente pelas lojas, sem nenhuma burocracia, sem filas intermináveis no aeroporto, apenas apresentando o passaporte. Portanto, os preços dos produtos em San Marino são mais baratos que os vendidos na Itália. Outra coisa interessante de observar são lojas que vendem armas de todos os calibres, além de espadas – em San Marino o porte de armas é liberado.
Onde comer:
terça-feira, 2 de dezembro de 2014
30 dias na Itália: Repubblica di San Marino
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